Queremos revisitar a luta pela paridade política, observando os processos históricos no México e no Brasil, onde algumas iniciativas ameaçam avanços na participação feminina.
O caso do México
Marcos históricos da participação política das mulheres no México:
1953 – é reconhecido o direito da mulher de votar e ser votada.
1996 – é legislada a primeira cota afirmativa buscando que as candidaturas de um gênero não ultrapassem 70%. O famoso 70/30. Isso é considerado uma cota ou ação afirmativa.
2008 – A ação afirmativa é alterada para 60/40 aumentando o número de candidaturas femininas obrigatórias para 40%. Ali, pela primeira vez, fala-se dos 2% em verbas que os partidos devem destinar aos processos que estimulem e facilitem a participação das mulheres.
2014 – o princípio da paridade é instalado. Passamos das cotas ou ações afirmativas para um acordo CONSTITUCIONAL de paridade.
2019 – se aprova a legislação para a paridade vertical de gênero aprovada (Legislativo, Executivo e Judiciário) e também horizontal (nos níveis Comunitário, Municipal, Estadual e Federal).
O Instituto acompanhou a votação pela paridade total no México em 2019. Este momento histórico está registrado no terceiro episódio da websérie Eleitas. Assista aqui.
O que as mulheres conseguiram com a paridade no México?
- Em 2018, foi alcançada a composição mais igualitária do Congresso.
- O Congresso Estadual de Jalisco obtém a maioria das deputadas femininas nas eleições de 2021.
- Houve progresso na legislação de direitos sexuais e reprodutivos em mais estados do país com o incentivo de mulheres legisladoras locais.
Paridade ameaçada
Hoje, em abril de 2023, tramita no Congresso Nacional uma iniciativa que busca que a Justiça Eleitoral ou as autoridades eleitorais não interfiram na busca pela paridade dos partidos.
Avanços na paridade não teriam sido possíveis sem o papel fiscalizador do judiciário.
É importante lembrar que parte das ações afirmativas vigentes no México e que permitem uma maior participação política de mulheres e grupos minoritários não estão na lei. Eles se aplicam devido à interpretação judicial ampla, progressiva e universal dos direitos políticos.
O caso do Brasil
Marcos históricos da participação política das mulheres no Brasil:
1932 – é reconhecido o direito de voto para as mulheres com renda própria, porém as casadas precisavam da autorização do marido para votar.
1934 – as restrições ao voto das mulheres foram removidas, com exceção das mulheres analfabetas (assim como dos homens).
1995 – primeira lei de cotas de gênero, determinando um mínimo de 20% de candidaturas de mulheres em cada partido ou coligação para as eleições municipais.
1997 – é prorrogada a lei de cotas, cada partido deve ter no mínimo 30% e no máximo 70% das candidaturas de cada gênero, com exceção das eleições para o Senado.
2009 – são corrigidos problemas da lei anterior e é obrigatória a quota mínima de 30% e máxima de 70% por género nas candidaturas.
2018 – o Supremo Tribunal Federal decide que a distribuição de verba eleitoral e tempo de propaganda eleitoral gratuita em canais de rádio e televisão deve respeitar cotas proporcionais, com mínimo de 30%.
2021 – Emenda Constitucional define que os votos concedidos a candidatas mulheres ou negras à Câmara dos Deputados nas eleições de 2022 a 2030 serão contados em dobro para fins de distribuição de verbas entre os partidos políticos.
O que conquistamos com as ações afirmativas no Brasil?
Embora tenha havido avanços na representação das mulheres na política, é possível afirmar que foram avanços insuficientes.
Nas eleições de 2022, o Brasil cresceu menos de 3% na representatividade feminina no Congresso. Quase 30 anos depois da primeira lei de cotas, o país ainda ocupa uma das piores posições do mundo para a participação feminina na política.
Segundo o Ranking Global de Mulheres nos Parlamentos da União Interparlamentar (2023), o Brasil está na 130ª posição entre 186 países. Entre os países latino-americanos, o Brasil ocupa a pior colocação do ranking, com exceção de Haiti e Venezuela, que não aparecem na lista.
Apenas 17,7% da Câmara dos Deputados são mulheres e 14,8% do Senado são mulheres (IPU, 2023).
As mulheres negras e indígenas são ainda mais sub-representadas. As mulheres negras representam um terço da população do Brasil e foram apenas 17% das candidaturas em 2022.
A anistia dos partidos
Os partidos têm buscado diversas formas de burlar as leis para não cumprir as determinações de maior representatividade feminina. De candidaturas fantasmas a candidatas mulheres que têm seus recursos desviados para materiais eleitorais para candidatos homens.
Agora, por meio de nova Emenda Constitucional (09/2023), buscam aprovar o que seria a maior anistia para os partidos, impedindo sanções para quem não destinasse os recursos mínimos de financiamento eleitoral para campanhas de mulheres e negros nas eleições de 2022. O mesmo foi aprovado em 2022 aos partidos que não cumpriram as cotas nas eleições de 2020.
Na prática temos uma lei que não é cumprida com a certeza da impunidade dos partidos. Precisamos de avanços mais rápidos e concretos para garantir a representação das mulheres, que são mais de 50% da população do Brasil.
Leia também: “Mas não resolvemos tudo com a paridade”.
Sobre as autoras:
Dany Fioravanti é uma comunicadora ativista com 13 anos de experiência e especialista em Políticas do Cuidado e Gênero pela CLACSO (Conselho Latino-Americano de Ciências Sociais). Trabalhou na ONG TETO no Brasil e no Equador, na Secretaria de Políticas e Promoção da Mulher do Rio e está coordenadora de comunicação na Im.pulsa.
Susana Ochoa é uma política feminista e fundadora do Futuro, um partido local no México. Coordenadora de inovação democrática na Fundação Artemisas na Colômbia, assistente de treinamento no Instituto Update e membro da Rede de Inovação Política da América Latina. Especialista em processos de formação política de mulheres, incidência política e comunicação.
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Fontes: