Se as conversas públicas sobre aborto muitas vezes se baseiam em pânicos morais e crenças religiosas, não basta se posicionar sobre o tema apenas a partir de dados e argumentos racionais.
Você também precisa se conectar com as pessoas através de emoções, e sensibilizá-las para a realidade de quem precisa do aborto legal.
Primeiro, vamos começar pensando: que medos e tabus rondam este tema?
“Aborto é pecado”: Sabia que essa não é uma verdade absoluta nem mesmo dentre as religiões?
Sim, você pode falar sobre como o Brasil é um país laico e as religiões não devem definir políticas públicas e direitos garantidos. Mas, para dialogar com pessoas ou grupos que levam suas crenças religiosas para a esfera pública, também é possível abrir espaços de diálogo mostrando que não há um pensamento único sobre o tema em qualquer comunidade religiosa.
Ouça aqui o Episódio Teologia Feminista: remover pedras, plantar flores do podcast Narrando Utopias.
Inclusive, dados de 2023 demonstram que a maioria das pessoas evangélicas e católicas são contra a prisão de mulheres por aborto.

Vale lembrar ainda que há uma série de pessoas e grupos ligados a diversas religiões que estão constantemente falando sobre o direito ao aborto a partir de uma perspectiva teológica, como Lusmarina Campos Garcia (pastora luterana), Ivone Gebara (freira católica), Católicas Pelo Direito de Decidir, Rede de Mulheres Negras Evangélicas, Evangélicas Pela Igualdade de Gênero e Mulheres Espíritas Pelo Direito de Decidir.
Aborto é perigoso: Você sabia que, na verdade, um aborto feito em segurança pode ser até 14 vezes mais seguro que um parto? Pois é isso que nos mostra um estudo científico, publicado na National Library of Medicine (Livraria Nacional de Medicina) dos Estados Unidos.
Você pode, então, ajudar a disseminar informações sobre como, na verdade, o que torna o aborto perigoso é a criminalização.
A própria Organização Mundial da Saúde (OMS) fala sobre a segurança do procedimento e que, nas 12 primeiras semanas de gestação, ele pode ser feito de maneira autônoma, até mesmo em casa, com medicamentos. Veja mais informações aqui.
Para mais informações sobre estes e outros tabus, você sempre pode procurar organizações e grupos que trabalham com direitos sexuais e reprodutivos, como o Futuro do Cuidado, que trazem informações baseadas em evidências científicas e trabalham para qualificar o debate público. Agora sejamos propositivas sobre como iniciar conversas sobre o tema.
Quais emoções você pode despertar ao falar sobre aborto?
Alívio: Um estudo realizado por pesquisadora das Universidade da Califoriia em São Francisco (UCFC), ao longo de 10 anos, descobriu que 90% das pessoas que conseguem fazer aborto sentem alívio ao pensar em sua decisão.
É esse o sentimento que você pode evocar ao falar de casos concretos de pessoas que conseguiram ter seu direito respeitado.
Enquanto isso, 60% das pessoas que tiveram um aborto negado relataram sentir tristeza.
Alegria: Quando novos direitos são conquistados, esta é uma ótima oportunidade para celebrá-los e falar sobre a importância de avançar cada vez mais neste tema, pela segurança e pela vida de todas as meninas, mulheres e pessoas que gestam. Algumas das conquistas mais recentes que pudemos celebrar foram:
- o aborto legal feito por telemedicina no SUS, desde 2020;
- o voto da Ministra Rosa Weber, em 2023, a favor da ação que pede a descriminalização do aborto até a 12ª semana de gestação;
- a suspensão da resolução do Conselho Federal de Medicina que impedia abortos legais acima de 22 semanas.
Mas você precisa evocar apenas emoções positivas quando falar sobre o tema? Claro que não. Pode evocar também…
Indignação: Ao falar sobre quem tenta restringir o direito ao aborto.
E sobre os impactos que isso causa na vida das pessoas obrigadas a levar adiante uma gestação.
Luto: Ao lembrar das vidas perdidas pela criminalização do aborto e pelas barreiras impostas no acesso ao aborto legal
Cada momento exige abordagens diferentes, e emoções diferentes a serem evocadas também. Mas não tenha medo de falar sobre aborto, e lembre-se que há outras mulheres na política que também têm se posicionado sobre o tema, de Kamala Harrisa Marina Silva.
Continue acompanhando a trilha “Como dialogar sobre aborto na política?” , que na próxima guia falaremos sobre como agregar dados e histórias a essa conversa.
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A Anis – Instituto de Bioética, Direitos Humanos e Gênero é uma organização não-governamental que desde 1999 busca promover cidadania, igualdade, direitos humanos e justiça reprodutiva em uma perspectiva interseccional.