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Este conteúdo, elaborado por uma coalizão de associações da sociedade civil e especialistas da área socioambiental e climática, tem como objetivo colaborar com sua campanha na construção e divulgação de propostas sociais relacionadas com as mudanças climáticas de forma que sejam atrativas e engajem suas eleitoras. Você tem alguma dúvida, sugestão ou comentário? Gostaria de ter mais informações sobre o tema acima? Acesse este link e fale com o grupo. 

Outubro 26, 2020. Por Organizações Especialistas na Agenda Climática

Infraestrutura e planejamento

Infraestrutura e planejamento: como cuidar da cidade para ela crescer certo

infraestrutura e planejamento

 

As cidades precisam de um novo modelo de crescimento, para continuar atraindo pessoas sem expandir de forma desenfreada, com uma infraestrutura que não destrua seus recursos naturais. Essa transformação demanda uma gestão eficiente do adensamento e uma lógica construtiva mais responsável.

Confira o material

 

Cidades são sistemas vivos. Elas têm um metabolismo: um fluxo de substâncias que circulam, alimentando seus processos. E, assim como uma árvore, ou um jardim, elas crescem, de maneira imprevisível, até certo ponto. Gerir uma cidade é cuidar desse processo complexo, zelando pelo bom funcionamento do metabolismo, e organizando os fluxos para que elas cresçam bem, sem destruir o ambiente a que pertence.

Hoje, no Brasil, as cidades estão crescendo mal. Elas vêm se  expandindo sem parar, de forma desordenada. Esse tipo de crescimento pressiona tanto a infraestrutura da cidade — que passa a ter que expandir cada vez mais sua malha de transporte, água, esgoto e energia — quanto o ambiente ao redor, deixando vulneráveis áreas de preservação ambiental, mananciais e toda a biodiversidade. 

Pessoas em uma estrutura portuária

As grandes cidades crescem de forma desenfreada, buscando recursos como água e matéria prima cada vez mais longe e gerando conflitos e escassez em outros territórios. Esse modelo tampouco é necessário: um estudo comparativo1 mostrou que, enquanto Atlanta abrigava 2,5 milhões de pessoas numa área construída de mais de 4.000 km² nos anos 1990, Barcelona acomodava a mesma quantidade de pessoas numa área 25 vezes menor, de apenas 160 km². Um exemplo prático para mostrar que é possível reduzir os impactos socioambientais causados pelas cidades ao planejá-las de maneira inteligente.

Para isso, é crucial encurtar os circuitos de produção e consumo, valorizando e respeitando os insumos locais e estimulando o desenvolvimento de novos modelos produtivos dentro da cidade, da agricultura ao reflorestamento comercial e nativo. Uma mudança de direção que demanda, por um lado, adensar a cidade para dentro, buscando aproveitar ao máximo a área já ocupada. Por outro, parar de devorar recursos cada vez mais distantes, transformando os resíduos já acumulados nas cidades em matéria-prima. Dessa maneira, é possível frear a expansão urbana destrutiva e regenerar as áreas verdes que cercam a cidade, para que ela volte a ser a fonte de água, ar e alimento.

Os governos municipais possuem grande potencial de atuação na sustentabilidade das construções e no planejamento do crescimento urbano. As prefeituras podem induzir e fomentar boas práticas por meio da legislação urbanística, do código de edificações, dos incentivos tributários e convênios com as concessionárias dos serviços públicos de água, esgoto e energia.

Adensamento 

  • É URGENTE ocupar bem os vazios urbanos. Os espaços sem uso precisam ser melhor aproveitados, e uma alternativa é transformá-los em moradia popular. O Brasil tem 6 milhões de imóveis vazios e 6,9 milhões de famílias sem moradia adequada2. O mecanismo já é previsto na Constituição Federal: imóveis que não estão cumprindo a função social da propriedade podem ser notificados, cobrados de IPTU progressivo e desapropriados — e essa medida pode ser incluída nos planos diretores. Outra opção é dar uso aos térreos das edificações, a partir do incentivo à fachada ativa, aproximando o comércio e o serviço das moradias. Ambas as medidas ajudam a aproveitar melhor o espaço urbano, a gerar empregos e a reduzir as necessidades de deslocamento, e consequentemente o trânsito, ao aproximar moradia e trabalho. Em Paris, um dos pilares da campanha da prefeita reeleita foi defender a “cidade de 15 minutos”, onde será possível ter acesso a todos os serviços e atividades básicas a pé.
  • É NECESSÁRIO investir na recuperação de edificações. Há muitos imóveis antigos ou fora de norma nas cidades, que são extremamente dispendiosos. Uma saída é apostar no retrofit, para requalificar e modernizar esses edifícios, ao mesmo tempo em que se gera empregos. A Cidade do Cabo, na África do Sul, apostou no retrofit para reduzir os casos de tuberculose nas comunidades mais vulneráveis, e a saída foi renovar os telhados de 8.000 casas para minimizar o frio e a umidade. Os benefícios são significativos, e o próprio município pode fazer isso com imóveis públicos para melhorar a eficiência ou para dar novos usos a prédios vazios ou subutilizados, transformando-os em moradia popular ou outros equipamentos públicos. 
  • UM DESAFIO: buscar recursos para a habitação. Uma saída é fortalecer fundos públicos para a habitação. É possível usar verbas da outorga onerosa (a taxa que construtoras pagam à cidade para construir edifícios além dos limites) para habitação social ou mesmo criar novos instrumentos, como a cota de solidariedade — que obriga que as construtoras de grandes empreendimentos destinem parte do terreno ou dos recursos para a moradia popular.
  • UMA IDEIA: aproveitar as lajes das casas para construção. Em Bogotá, a prefeitura lançou um plano para identificar os imóveis com potencial para ganhar segundos e terceiros pisos e incentivar proprietários a adequarem suas casas — podendo lucrar posteriormente com o aluguel desses novos andares construídos. A prefeitura oferece assessoria técnica para garantir a segurança, apoio financeiro e uma rede onde encontrar mão-de-obra qualificada. No Brasil, esse modelo já está previsto em lei, e é possível de viabilizar uma iniciativa parecida por meio da Assistência Técnica em Habitação de Interesse Social (ATHIS). Só é importante atentar para a adequação legal das áreas de intervenção, que talvez precisem passar por regularização fundiária, e para a necessidade de realizar vistorias constantes, para garantir a segurança dos imóveis e dos moradores.

Construção sustentável

  • É URGENTE reduzir o uso de matéria-prima virgem. As cidades precisam parar de fazer uso predatório dos recursos naturais e se tornarem agentes de combate efetivo às mudanças climáticas. Estratégias de eficiência material podem proporcionar reduções de mais de 80% de gases poluentes e de mais de 35% de consumo de energia3. A prefeitura de São Paulo publicou recentemente um manual sobre o uso sustentável da madeira na construção civil, que mostra a importância de utilizar apenas madeira certificada ou de reflorestamento.
  • É NECESSÁRIO ter a natureza como aliada. Nossas cidades precisam mudar toda sua lógica construtiva, adotando infraestrutura verde e adequando seus projetos ao clima local e à orientação solar, para minimizar o consumo de energia e otimizar as condições de ventilação, iluminação e aquecimento naturais. Telhados verdes podem refrescar as cidades e aproveitar com mais eficiência sua insolação e seu espaço. Cidades podem também incentivar o melhor aproveitamento de recursos naturais, por exemplo oferecendo condições vantajosas de crédito para quem captar a energia do sol ou a água da chuva.
  • UM DESAFIO: a maior parte do descarte ainda vai para aterros ou lixões. Metade dos resíduos sólidos descartados vêm da construção civil, e quase nada é reaproveitado. Um jeito de olhar para esses números frustrantes é vê-los como uma oportunidade: significa que a cidade tem à disposição toneladas de materiais que poderiam ser melhor utilizados — e é possível incluí-los novamente no circuito incentivando práticas de economia circular. Além disso, é importante lembrar que é dever das empresas da construção civil a destinação correta dos resíduos de obras. A logística reversa é um dos instrumentos para fazer valer essa determinação, a partir da restituição dos resíduos sólidos ao setor empresarial para reaproveitamento ou outra destinação final adequada.
  • UMA IDEIA: o programa “hipotecas verdes” do México. Criado pelo Infonavit, um órgão do governo mexicano voltado à habitação, o programa consiste em crédito para todo mundo que queira investir em tecnologias verdes para suas casas. O dinheiro, emprestado em condições vantajosas, pode ser usado para investir em tecnologias que poupem materiais, água, luz ou gás. E o cidadão ganha depois, na redução da conta.

IMAGINE O DIA em que a vida da cidade deixar de produzir exclusão e destruição. Cidades são lugares de enorme abundância, mas de desperdício maior ainda. Depois de alguns mandatos de gestões municipais atentas, é possível reequilibrar esse metabolismo, cuidando para que cada processo da cidade ajude a alimentar algum outro, o que leva tudo ao equilíbrio.

NÃO ESQUEÇA: respeite a cidade como o sistema vivo que ela é. O trabalho do gestor não é impor seu olhar sobre a cidade, determinando seus usos, prevendo o que ela será no futuro. Um bom gestor é mais como um bom jardineiro, que fornece recursos, alimentos e espaço, mas deixa que a vida se expresse, sem querer controlar tudo.

Conteúdo revisado em 15 de dezembro de 2023.

  1. https://usa.streetsblog.org/2014/09/03/wowza-scale-maps-of-barcelona-and-atlanta-show-the-waste-of-sprawl/
  2. Ver em: Brasil tem 6,9 milhões de famílias sem casa e 6 milhões de imóveis vazios, diz urbanista. BBC Brasil, 07/05/2018.
  3. International Resource Panel, 2020. No relatório: “Resource Efficiency and Climate Change: Material Efficiency Strategies for a Low-Carbon Future”. Os dados também foram incluídos no texto de recomendações: “Construindo sociedades resilientes após a pandemia da Covid-19”.
Organizações Especialistas na Agenda Climática

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